As dúvidas do presidente @ Revista Sábado

   "O programa de ajuda externa da troika tem muitos pontos que podem ser atacados: para os funcionários públicos, vai aumentar drasticamente o desemprego; para os funcionários do privado, vai liberalizar os despedimentos; para os empresários, vai eliminar as taxas reduzidas de IRC; para os trabalhadores, vai subir o IRS; para os desempregados, vai cortar o subsídio de desemprego; para os empregados, vai reduzir as indemnizações pagas pelos patrões; para os comunistas, vai privatizar o Estado; para os capitalistas, vai obrigar a subir os rácios de capital da banca; para os médicos, vai interferir na escolha dos medicamentos que receitam; para os professores, vai destruir a escola pública; para os nacionalistas, vai colocar estrangeiros a controlarem o Governo; para os regionalistas, vai destruir o poder local, cortando câmaras municipais e juntas de freguesia.
   Como se vê, é fácil encontrar alguém descontente com o memorando da troika e é ainda mais fácil encontrar desculpas para não aplicar o que lá está previsto. Mas uma coisa é inegável: o documento assinado com o FMI, a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu é uma forma de racionalizar as despesas absurdas do Estado e é a única maneira de conseguir dinheiro emprestado na situação em que o País se encontra. Neste momento, a última coisa que Portugal precisa é um Governo que hesite e de um Presidente da República que baralhe. Ao reconhecer que o documento de ajuda externa não é "100% perfeito" e que pode sofrer alterações, Cavaco Silva está a abrir uma auto-estrada de excepções. Está a permitir que a banca proteste contra o aumento dos rácios de capital, que os autarcas boicotem a diminuição de câmaras municipais ou que o povo se revolte contra a subida dos transportes públicos. Está a retirar legitimidade às reformas e apoio ao Governo. No fundo, está a reabrir um debate que, nesta fase, já deveria estar encerrado.
   É normal que muitos portugueses possam ter dúvidas sobre o memorando da troika. Só não é aceitável que um desses portugueses seja o Presidente da República. Num momento em que o futuro do País depende da aplicação deste acordo, Cavaco Silva deveria pensar duas vezes antes de revelar os seus estados de alma. Ou qualquer dia, arrisca-se a acordar na Grécia."

Um texto do editorial da revista Sábado da semana que passou, com o qual concordo na totalidade. 
Revista nº 379 - 4 a 10 de Agosto de 2011

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